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Entrevista  08 set 2025

“Portugal precisa de acelerar a adoção da inteligência artificial”

Fernando Braz, Country Leader da Salesforce em Portugal, afirma que a inteligência artificial já está a transformar setores como a banca, as telecomunicações e o retalho, mas alerta que a adoção ainda é marcada por conservadorismo e pela falta de qualidade nos dados.

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A Salesforce mantém presença direta em Portugal desde 2019, altura em que abriu a operação local. Desde então, tem vindo a reforçar a equipa e a trabalhar num modelo assente na combinação entre clientes, parceiros e ecossistema. Segundo Fernando Braz, a decisão de investir no país teve por base a confiança dos clientes e o potencial de crescimento do mercado, que tem revelado abertura à transformação digital, ainda que a ritmos diferentes consoante os setores.

As áreas onde a empresa construiu maior presença continuam a ser as associadas ao CRM e ao serviço ao cliente, com extensões no marketing digital, comércio eletrónico, integração de sistemas, análise de dados e colaboração via Slack. “Esta base foi reforçada com a inteligência artificial”, explica Fernando Braz, recordando que a Salesforce integrou há quase uma década capacidades preditivas no CRM e, mais recentemente, avançou com soluções de IA generativa, que considera estarem a marcar a diferença.

Que setores estão mais avançados na adoção de inteligência artificial?

A banca é apontada como um dos setores mais ativos na utilização de IA, nomeadamente na gestão de reclamações, no apoio às vendas e na interação digital com clientes. Telecomunicações e retalho seguem no mesmo caminho, tanto através de grandes grupos como de empresas mais pequenas que procuram diferenciar-se pela rapidez de resposta e pela personalização. Fernando Braz lembra que até as PME encontram benefícios significativos, já que conseguem aumentar a produtividade sem necessidade de contratar mais recursos.

Um dos exemplos públicos referidos pelo responsável é o setor imobiliário, onde agentes inteligentes estão a ser usados para gerir leads de forma mais eficiente. Contudo, sublinha que os resultados não surgem automaticamente: “a tecnologia não faz magia, depende da qualidade dos dados”, diz, lembrando que sistemas de IA só entregam valor quando as organizações têm os seus dados organizados e consistentes.

A qualidade dos dados continua a ser o maior desafio?

A Salesforce aposta na sua plataforma Data Cloud para simplificar a gestão e integração de informação de diferentes sistemas, mas Frenando Braz insiste que o desafio continua a estar na disciplina com que as empresas tratam os seus próprios dados. “Garbage in, garbage out”, resume, defendendo que os agentes inteligentes só funcionam se tiverem acesso a dados corretos e atualizados.

A integração é outra frente de trabalho. A empresa desenvolveu o conceito de “Agentic Enterprise”, que permite gerir diferentes agentes de IA de forma consolidada, independentemente da origem da informação. A ideia é evitar a fragmentação e permitir que cada empresa avance ao seu ritmo, começando por áreas específicas — como marketing, vendas ou apoio ao cliente — e evoluindo depois para modelos mais integrados.

O conservadorismo português pode travar a competitividade?

Fernando Braz considera que o conservadorismo português tem vantagens em determinados contextos, mas na área tecnológica pode tornar-se um entrave. Recorda que o mesmo aconteceu com a computação em cloud, quando inicialmente havia forte resistência em colocar dados fora das organizações. Hoje, defende, essa barreira já está ultrapassada, mas ainda existem infraestruturas críticas nacionais que continuam fora da cloud.

O gestor alerta que essa demora pode comprometer a competitividade da economia nacional, sobretudo quando comparada com outros mercados europeus. Destaca que nenhum operador isolado consegue investir em cibersegurança ao nível dos grandes fornecedores globais de cloud, como AWS ou Google, e reforça que a agilidade de resposta ao cliente é cada vez mais determinante.

Já existem empresas portuguesas com visão unificada do cliente?

O conceito de “Customer 360”, que assenta numa visão unificada das interações do cliente, já começa a ganhar terreno em Portugal, com casos em banca, indústria e telecomunicações. Fernando Braz explica que o processo de adoção é gradual e depende da capacidade de cada empresa integrar diferentes componentes — apoio ao cliente, marketing, comércio eletrónico e dados transacionais. Ainda assim, garante que já existem exemplos nacionais em que esta visão está em prática.

Que papel têm os parceiros no crescimento da operação em Portugal?

O ecossistema de parceiros é outro pilar estratégico. Em Portugal, a Salesforce combina a atuação de grandes multinacionais de consultoria com empresas nacionais de menor dimensão, que têm maior flexibilidade para apoiar clientes de pequena e média escala. “São um braço essencial para o crescimento da operação local”, sublinha Fernando Braz, destacando que o número de parceiros tem aumentado de forma consistente.

A Salesforce será também patrocinadora do Portugal Digital Summit, em outubro, evento focado no comércio eletrónico e na transformação digital. Para Fernando Braz, “a presença nestas iniciativas é parte do ADN da empresa, permitindo mostrar soluções e promover o debate sobre o impacto da inteligência artificial.”

O preço ainda é visto como uma barreira?

Questionado sobre a perceção de que as soluções Salesforce seriam demasiado dispendiosas, Fernando Braz rejeita a ideia. Afirma que a empresa raramente perde oportunidades por questões de preço e que consegue demonstrar, em cada caso, o retorno do investimento. Sublinha que os projetos são avaliados de forma estruturada, com margens percentuais de eficiência mensuráveis, e que os ganhos em rapidez de resposta e produtividade compensam o custo inicial.

No final da conversa, Fernando Braz deixa um aviso: a transformação digital é inevitável e a inteligência artificial será parte integrante do futuro das empresas. Para o responsável, Portugal só será competitivo se adotar estas tecnologias sem receios, experimentando e aprendendo rapidamente, em vez de esperar que outros avancem primeiro.

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